O ferro é um micronutriente essencial à vida. Ele está presente na maioria das reações químicas do corpo, faz parte da molécula de hemoglobina (responsável pelo transporte de oxigênio) e é essencial para o crescimento e desenvolvimento adequado dos órgãos e músculos.
Por estar presente na hemoglobina, a falta de ferro determina uma queda nos seus níveis e, por consequência, a anemia ferropriva (ou seja, por falta de ferro). Muitas pessoas acham que todas as anemias podem ser resolvidas com ferro, mas na realidade apenas a anemia ferropriva se resolve com ferro. Essa confusão acontece porque a anemia ferropriva é a mais comum, principalmente em países em desenvolvimento, como o nosso. E a principal causa da anemia ferropriva é a alimentação pobre em ferro ou dificuldades na sua absorção (como em doenças intestinais).
Crianças dependem da alimentação para adquirir ferro
Normalmente, a quantidade de ferro presente em nosso corpo é preservada e ele é reutilizado. No adulto, essa reciclagem é responsável por aproximadamente 95% das necessidades de ferro, enquanto os outros 5% são adquiridos pela alimentação. Entretanto, na criança, principalmente as menores de 1 ano, até 30% das demandas de ferro devem ser supridas pela dieta – e por isso que há indicação da reposição, como falaremos mais para frente. Além disso, as crianças têm mais necessidade de ferro, visto que estão em franco crescimento.
Contudo, absorvemos apenas 10% do ferro que ingerimos. E essa absorção é regulada pelo intestino – se há falta do nutriente, ela aumenta; se os estoques estão em dia, a absorção é reduzida. A absorção depende também do tipo de alimento – as carnes têm um ferro mais fácil de absorver do que os vegetais. Além disso, a quantidade de ferro nos vegetais pode até ser elevada quando avaliamos a quantidade por grama; porém, por serem muito leves, comemos poucas gramas deles e, consequentemente, menor quantidade de ferro. O ambiente ácido do estômago ajuda na absorção; por isso que comer frutas ácidas junto com a refeição ajuda a absorção de ferro. Existem ainda alimentos que competem com o ferro para serem absorvidos e reduzem sua absorção – como o cálcio presente no leite, os taninos presentes no café e em refrigerantes, entre outros.
Em pacientes vegetarianos, como há menos ingestão de ferro (pela não ingestão de carnes), o corpo regula a excreção de ferro e diminui a sua perda, reduzindo sua necessidade dietética.
Nos bebês, a absorção de ferro é maior no último trimestre de gravidez (mais de 2/3 da quantidade de ferro do corpo é absorvida neste período). Portanto, bebês que nascem antes da hora, os prematuros, têm mais risco de ter falta de ferro e, por isso, precisam de reposição desde o nascimento. Contudo, sabe-se que nos países em desenvolvimento, de 30% a 50% das gestantes têm reservas reduzidas de ferro e, se não houver reposição na gravidez, os seus bebês adquirem mais risco de terem falta de ferro, mesmo que nasçam no tempo correto.
Mas além de causar anemia, o que a falta do ferro pode causar?
Consequências da falta do nutriente vão muito além da anemia
Por estar presente na maioria dos tecidos e ser essencial para a maioria das reações que ocorrem no corpo, a sua falta pode afetar quase todos os órgãos. Na minha opinião, os piores efeitos da falta de ferro são na inteligência e no sistema imunológico.
Existem estudos que sugerem que a falta de ferro apresenta efeito negativo sobre a inteligência, o que pode ser irreversível, pois os pacientes estudados não recuperaram todo o potencial após reposição. Isso foi notado quando a falta de ferro ocorre principalmente em fases precoces da vida (como a infância). Há que se ressaltar que níveis socioeconômicos mais baixos têm menor acesso a alimentos ricos em ferro – o que se soma à desvantagem cognitiva (por haver menor escolaridade, menores e piores oportunidades e menos estímulos).
Além disso, sabe-se também que pacientes com falta de ferro têm um sistema imunológico prejudicado e, portanto, mais chance de ficarem doentes. Nota-se que, após a reposição de ferro, há melhora da imunidade e os pacientes param de ficar tão doentes.
Sim à reposição preventiva de ferro!
Diante de toda essa importância do ferro e da grande prevalência da falta deste mineral, a Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda a reposição de ferro na criança desde o terceiro mês de vida até os 2 anos. Para os bebês que nascem abaixo do peso (abaixo de 2500g) e prematuros, a indicação é começar logo após o nascimento e em doses maiores no primeiro ano de vida, voltando à dose usual até o segundo ano. Entretanto, já ouvi de pediatras e pais que essa recomendação é apenas para os pacientes pobres. Esse é um erro e um grande preconceito. Eu já vi diversos pacientes com acesso a comida de qualidade terem falta de ferro. Tendo em vista que a falta de ferro pode causar danos irreversíveis na criança, por que correremos o risco? A reposição preventiva do ferro é simples, feita com medicações de baixo custo e até disponíveis no SUS.
Muitos questionam também se não pode haver excesso de ferro e isso fazer mal àqueles pacientes que eventualmente não teriam falta de ferro. O nosso corpo realmente não tem mecanismos para eliminar o ferro; porém, a quantidade indicada para prevenção não é capaz de causar um acúmulo de ferro que traga prejuízo (para isso é necessário uma grande quantidade de ferro, por longos períodos como, por exemplo, 10 transfusões de sangue). Além disso, caso os estoques de ferro estejam bons, o intestino será regulado de forma a absorvê-lo menos.
Portanto, não há desculpa para não usar o ferro preventivo. Converse com seu pediatra sobre isso caso ele ainda não tenha prescrito. E dê ferro ao seu filho!