Precisamos falar sobre antivacina

Postado em 28 de setembro de 2017 por .

pediatra

Dra. Juliana M. Franco, pediatra geral e hematologista pediátrica da Clínica Pediátrica Pueritia

A cobertura de vacina no Brasil em 2016 foi a menor dos últimos dez anos segundo o Ministério da Saúde – metade das crianças e adolescentes brasileiros está com a vacinação desatualizada. Ao ver esse índice, não há como não considerar os movimentos de antivacina, que têm crescido com força nas redes sociais e compartilhado informações equivocadas, sem nenhum fundamento científico.

Esses movimentos são contrários à vacinação por motivos diversos – todos facilmente desmentidos pela ciência – e, depois de se espalharem pela Europa e Estados Unidos, estão se tornando populares no Brasil, especialmente entre as classes média e alta.

 

O que tem em uma vacina?

Antes de qualquer coisa, vamos entender o que é que aplicamos ou oferecemos às crianças.

A vacina pode ser feita com o agente (vírus ou bactéria) vivo ou morto:

  • Quando o agente é vivo, ele passa por um processo que reduz sua capacidade de causar doença e, portanto, não a causará em pessoas e crianças saudáveis. A vacina é então chamada de vacina com agente vivo atenuado, como é o caso da vacina tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola), poliomielite oral e rotavírus, dentre outras. Essas são contraindicadas para pessoas com imunodeficiência ou gestantes;
  • Outras vacinas são feitas com o agente morto ou com partes deste agente, que são capazes de fazer o nosso sistema imunológico reconhecê-lo e produzir anticorpos contra ele.

Em ambos os casos, essa produção de anticorpos fica na memória do nosso corpo para que, no futuro, caso o paciente entre em contato com o agente, ele saiba prontamente se defender produzindo anticorpos e, deste modo, não ficar doente.

Graças ao desenvolvimento das vacinas no século 20, a Medicina avançou muito: já eliminamos aqui doenças como varíola, sarampo, rubéola e pólio. A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece, hoje, que vacinar é uma das formas mais efetivas de reduzir a mortalidade infantil.

Os benefícios das vacinas podem ser mais bem compreendidos por meio deste gráfico interativo que a Revista Science publicou: ele mostra o impacto da criação e do uso de vacinas ao longo dos anos contra nove doenças difteria, pólio, coqueluche, hepatite B, sarampo, catapora, hepatite A, caxumba e rubéola.

Tudo muito claro e prático. Por que, então, não tomar?

 

vacina antivacinaAs razões de quem não tem razão

Os movimentos antivacina estrangeiros e brasileiros alegam de tudo para tirar esta prevenção da vida de suas crianças: há razões filosóficas, antroposóficas (em linhas muito gerais, concepção de saúde que considera as dimensões emocional, mental e espiritual) e a preferência por medicinas alternativas, como a homeopatia.

Não desrespeitamos nenhuma crença ou preferência, mas é preciso compreender que o uso de óleos e alimentação equilibrada não evitará o surgimento e pulverização de doenças virais sérias. Estes tratamentos alternativos podem se somar às vacinas, que são verdadeiramente capazes de erradicar doenças infecciosas.

Há, também, o discurso dos efeitos colaterais: não vou deixar aplicar, pois a criança vai sofrer. De fato, pode haver dor no braço, inchaço e vermelhidão onde a agulha é inserida. Há pacientes que relatam febre e até os sintomas da doença para a qual se busca a prevenção. É muito raro o relato de choque anafilático.

Porém, é preciso compreender que sim, os efeitos podem existir, mas são rápidos e passageiros, e não se comparam ao benefício estendido da proteção vacinal. Uma criança com poliomelite, por exemplo, tem seus movimentos afetados pelo resto da vida, e essa é uma doença transmitida de pessoa para pessoa.

Uma das origens do movimento antivacina foi um estudo fraudulento, de 1988. O médico britânico Andrew Wakefield publicou em uma prestigiada revista científica um artigo ligando casos de autismo à vacina tríplice viral. Mais tarde, ficou provado que era falso, e que ele tinha sido contratado por advogados que queriam processar fabricantes de vacina. Até isso acontecer, a antivacinação já tinha feito o sarampo reaparecer na Europa. Este médico se retratou e perdeu sua licença médica após o escândalo.

 

Retrocesso sem precedentes

Nos Estados Unidos, pediatras hoje podem negar o atendimento a pais que se recusam a imunizar os filhos.

O maior risco de a população não mais se vacinar é a volta de doenças já erradicadas. As doenças são transmissíveis, então, quando o filho de seu vizinho não se vacina, ele está colocando o seu filho em risco também, pois está ameaçando a proteção coletiva. É o que chamamos de vacinação de rebanho: quando uma única pessoa não se vacina, mas a maioria ao redor se vacina, não há a circulação da doença e, portanto, a pessoa não vacinada não adoece. Cria-se a falsa ideia de que você pode então não se vacinar.

Porém, quando há um número maior de pessoas não vacinadas, a doença volta a circular e acaba infectando os desprotegidos, causando doenças e até mortes que poderiam ser evitadas.

A OMS afirma que, por ano, entre duas e três milhões de mortes são evitadas graças à vacinação, sobretudo de difteria, tétano, sarampo e rubéola. Porém, ela também registra a morte anual de dois milhões de pessoas por doenças que já têm imunização.

Cuidado com informações sem fontes seguras encontradas nas redes sociais. Converse com especialistas e informe-se com profissionais confiáveis antes de tomar decisões que afetarão para sempre a vida de seu filho. Venha conversar conosco na Pueritia – vamos esclarecer todas as dúvidas e acompanhar cada etapa da saúde dele!